É na caixinha de areia que se aprende a CONviver com outros humanos

por Mª Aparecida Costa
publicado em: atualizado em:

Dou sinal de parada para o ônibus, me aproximo da porta e, distraída, não observo que uma jovem mãe e seu filho também o fazem. Já nos primeiros passos na calçada me surpreendo com a voz delicada da criança:

Mãe, é a primeira vez que uma mulher desce do ônibus antes da gente!

Surpresa maior com a resposta da mãe: – ACHO QUE ELA DESCEU PRIMEIRO porque … As últimas palavras ficam inaudíveis. Ouço seu riso e a resposta da criança: mesmas palavras, mesmo tom, mesmo riso e mesma descortesia. Sem ser consultada, me tornei exemplo para uma “lição de casa”.

Ah que falta de respeito, penso eu! Meu primeiro ímpeto é de reagir agressivamente – olhar para trás e ofertar meu “melhor” olhar de recriminação. Bom que os ímpetos, ao longo dos anos, foram dando lugar à maturidade que inibe esta ação e me faz perceber, a tempo, que essa cena nada tem a ver comigo.

Presencio um momento de intimidade e orientação de mãe para filho. Eles são sujeitos dessa ação e tudo acontece dentro daquilo que acreditam. 

Isentar meu coração de qualquer sentimento negativo quanto a essa cena é saudável, mas não posso me furtar de pensar qual o modelo de educação que as nossas famílias seguem hoje. São gestos pequenos como esse que vamos percebendo aqui e acolá – o quanto erramos a mão quando tentamos transformar a educação rígida que tivemos.

A mãezinha, talvez tenha perdido a oportunidade de ensinar ao filho a beleza da convivência humana baseada no respeito – como dividir com os amiguinhos os espaços da caixinha de areia no parquinho e como, ao longo da vida, saber esperar a vez de entrar em estradas sem precisar fazer ultrapassagens inadequadas.

Naquele momento uma reposta simples e verdadeira poderia tê-los aproximado mais de uma educação de pessoas para viver em sociedade:

Filho, essa senhora desceu na frente porque estava mais próxima à porta!

Mas nem tudo é culpa da mãezinha

Temos que superar esse modelo de culpar as famílias. Estamos colhendo frutos de anos de ausência de políticas públicas sérias voltadas para a população. Há décadas vemos o descaso na educação, escolas sucateadas, programas de saúde pública ameaçados, jovens sem perspectivas de futuro e esperamos que a família sozinha resolva o problema? 

Responsabilizar a mãezinha e todos os pais / mães reproduz a violência e ajuda a manter a forma como se encontra a vida em uma sociedade que nos faz acreditar (e defender) que a responsabilidade pelo sucesso ou insucesso é individual, pessoal e intransferível.

É como se nos dissessem: – Se você tiver forças para nadar em um mar revolto e cheio de tubarões você conseguirá triunfar e chegar vivo à ilha! 🙁 e se você não chegar é porque seu esforço não foi o suficiente.

Há muito Paulo Freire tenta se fazer ouvir e em sua voz imortal nos diz que através de uma boa educação podemos transformar nossa realidade e mudar o mundo. Só que não é tão simples assim… Ele nos diz:

Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceber as injustiças sociais de maneira crítica.” Paulo Freire

E de quem Paulo Freire fala quando se refere às classes dominadas? De todos nós, ou da maioria de nós, que sobrevive tentando evoluir respirando o mesmo ar no mesmo espaço histórico.

Através da educação forma-se o cidadão

Do livro Educação: um Tesouro a Descobrir, sob a coordenação de Jacques Delors – a educação deve preocupar-se em desenvolver quatro aprendizagens, que servirão para o indivíduo como pilares verdadeiramente libertadores da ignorância:

  • Aprender a conhecer,
  • Aprender a fazer, 
  • Aprender a conviver – desafio de aprender o verdadeiro sentido das palavras tolerância, respeito ao bem comum tendo o diálogo como base para a convivência com o outro.
  • Aprender a ser – talvez o mais importante dos pilares, valoriza o papel do cidadão e o objetivo de viver.

É preciso despir as camisetas de cor única, é preciso ver pessoas com camisetas multicoloridas em que o vermelho, amarelo, verde ou azul não se sobreponha às camisetas brancas que simbolizem PAZ e UNIÃO.

União na compreensão que o individualismo apenas separa, isola, maltrata e inibe o crescimento coletivo. E que uma nação somente se faz forte quando pudermos dividir, de forma igualitária o espaço da caixinha de areia onde as crianças possam aprender a conhecer, fazer, SER e CONVIVER. 

Precisamos pensar na educação em nosso País. E com URGÊNCIA!!

Ideologia?

Ideologia
Eu quero uma pra viver
Ideologia
Eu quero uma pra viver

                                Cazuza

Por: Maria Aparecida Costa

Assistente Social e Educadora em Saúde Pública

Especialização em Gerontologia.

Para saber mais sobre Educação:

Pedagogia para Concurseiros

Educacional

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2 comentários

Goretti 29.set.2018 - 09:03

Belíssimo texto!

Responder
Mª Aparecida Costa 01.out.2018 - 15:05

Obrigada! <3

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