Ubuntu: “Eu sou porque nós somos”

Entre as experiências que merecem ser compartilhadas, neste post divido com vocês, sentimentos e emoções durante uma viagem aventura por três países do imenso continente africano, berço da humanidade e parte de minha ancestralidade.

A viagem tem início no dia dois de maio de 2019 em Joanesburgo na África do Sul, na sequência Botswana rumo à Victória Falls no Zimbabue, um trajeto de mais de 2000 km de caminhão.

Nem nos melhores sonhos vivi momentos tão lindos e significativos e o nomeei como “Momento Ubuntu”.

Um dos momentos mais preciosos e emocionantes durante a viagem por Botswana, ocorreu durante o passeio pelo Delta do Okavango. Passeamos numa espécie de canoa pelo Delta, apreciando a natureza exuberante do lugar, com suas plantas aquáticas, animais selvagens no entorno e também fizemos uma caminhada de mais de mais de duas horas com um guia com a finalidade de conhecermos a região e vermos animais como: elefantes, girafas, búfalos, babuínos entre outros.

No retorno dessa caminhada os guias e barqueiros haviam organizado, numa clareira entre árvores e arbustos, um local para almoçarmos, acomodaram as cadeiras que estavam nas canoas nesse local. Quando cheguei, resolvi ficar ao lado de uma das barqueiras que estava sentada num tronco de árvore caído no chão, logo após outra mulher sentou-se ao meu lado.

A forma de me comunicar foi através do sorriso, algumas mímicas e o meu inglês muito incipiente, me apresentei, perguntei seus nomes, a mais jovem chamava-se Rita e a outra Naromy.

Quando todos já estavam acomodados recebemos uma espécie de marmita que continha dois lanches de pão integral com queijo, uma banana e uma mexerica, perguntei através de mímica se tinham se alimentado, responderam que não, balançando a cabeça.

Resolvi compartilhar meu almoço e assim ofereci um pedaço de lanche para cada uma e ao repartir falei Ubuntu, eu sou porque nós somos. Naromy respondeu – yes Ubuntu, continuamos conversando, fiz algumas mímicas simbolizando a partilha e ela também confirmava com gestos, meu amigo Tande que estava viajando comigo ao presenciar a cena também ofereceu um de seus lanches para elas.

Rita segurou o lanche e percebi que trocava olhares com um dos garotos que tinha acompanhado o guia durante nossa caminhada pelo Delta e logo em seguida entregou o lanche para ele, outros turistas participantes do meu grupo também começaram a compartilhar seus lanches, fiquei muito emocionada.

Um dos guias falou algo e não consegui compreender, meu amigo Sergio traduziu a informação, que os lanches com carne elas não comiam em virtude de sua religião.

Em um flash me lembrei da história de um antropólogo que propôs uma brincadeira com crianças de uma tribo Zulu. Era uma competição onde elas deveriam correr e o primeiro a chegar ganharia todos os doces. Para sua surpresa, as crianças deram as mãos e juntas dividiram o prêmio.

Diante da surpresa do antropólogo, as crianças disseram:

Ubuntu, tio. Como uma de nós poderia ficar feliz se todas as outras estivessem tristes?

Percebo que o termo ‘Ubuntu” simboliza mais que uma história e sim um modo de viver em comunidade, partilhando o bem comum. Seguimos conversando, elas me perguntaram se eu tinha filhos, qual a idade deles e falaram sobre elas, Naromy tem cinquenta e cinco anos e cinco filhos, três adultos e duas crianças que estavam na escola e Rita 34 anos e três filhos, bom pelo menos foi isso que entendi.

Ao finalizar o almoço colocaram alguns produtos artesanais feito com palha, algumas pessoas do grupo vieram apreciar e ao saberem o preço, desistiram da compra. Comprei duas pulseiras por U$20,00, – o significado daquelas peças e daquele encontro tinham outro valor, o qual não consigo nem dimensionar.

Disse à “ I seeyou/Eu vejo vocês” e ao falar isso parece que via toda minha ancestralidade, lembrei da minha vó materna, minhas tias que faziam cestos e vassouras com a palha do licuri no interior de Alagoas, mas essa já é outra história, ou melhor, são histórias que se entrelaçam.

Por Nanci Rodrigues Chaves

Pedagoga, professora de Educação Infantil Aposentada pela PMSP, Facilitadora de Dança Circular