Escrever é um dos talentos mais sublimes. Algumas pessoas conseguem através da escrita transformar dor em poesia, tristeza em reflexão, fragilidade em força…
Com esse texto poético, Clara Baccarin, nos faz olhar com muito mais otimismo o envelhecer.
Leia comigo, vivencie suas palavras:
Temos o costume de pensar que envelhecer é um caminhar para o fim, é um definhar, murchar, envergar. Quando jovens, a nossa visão mais à frente na vida, o nosso marco de chegada é o topo da montanha (as conquistas que este mundo ainda nos reserva). Quando velhos, a nossa visão mais à frente, o nosso marco de chegada (ou partida) é o vale, a desconhecida planície para onde não queremos caminhar, mas que a gravidade e o tempo se incumbem de nos empurrar, e que representa o fim das aventuras.
Pensamos que, depois do ápice adulto da vida, o caminhar da velhice é um declive, o corpo vai se curvando, a pele enrugando, o pensamento falhando, a importância diminuindo, a vida esvaecendo.
Mas eu gosto de pensar no ato de envelhecer não como o caminhar na montanha, com subida, ápice e descida. Gosto de pensar no envelhecer como o amadurecer de uma árvore, que se fortalece com o tempo, solidifica, e através das sábias curvas de seus galhos que souberam perseguir a luz do sol, acabou aprendendo a chegar mais perto do céu.
Gosto de pensar na velhice não como perda, mas como soma. Me parece que, pelo menos para quem gosta mesmo da vida, envelhecer não é perder a juventude, mas é um somar de personalidades, traços, fases, tempos, eus…
Envelhecer é um agregar, é possuir nesse mesmo corpo gasto, todos os seres que aqui habitaram um dia: a criança, a jovem, a adulta. É lembrar-se de cada uma dessas fases e senti-las ainda presentes aqui dentro.
Envelhecer não é um descartar fases que passaram com o tempo e me transformaram em um outro ser, mais frágil, atrasado e sem esperanças. Envelhecer é possuir nesse corpo curvado a robustez de todas as mulheres que fui, a amplidão de uma vida que foi vivida.
Envelhecer é tornar-se múltiplo. Como a árvore antiga e persistente que se constitui, em matéria e essência, dos anéis de outras épocas. E essa casca enrugada, aparentemente frágil, é força que soube resistir às intemperes do mundo e possui a sabedoria de preservar dentro de si, correndo vivos, rios de seivas e sentimentos.
Do site A Soma de Todos os Afetos