Parecia um dia comum de atendimento em meu trabalho voluntário até que fui surpreendida com o choro contido de uma senhora de 62 anos… que de tão contido lhe fazia tremer o corpo e travava sua boca impedindo-a de falar. Um choro seco e sem lágrimas, um profundo lamentar!!
Era o choro de uma filha ante a difícil escolha: o cuidado com a mãe idosa e o namorado. Marilda sempre viveu com a mãe e conseguiu manter um relacionamento em casas separadas durante 30 anos. Com o agravamento do estado de saúde da mãe ficou difícil conciliar as duas situações. O namorado, insatisfeito exige atenção e cuidado que ela não consegue suprir.
Essa história pode ter detalhes diferentes da vida de muitas Marildas, Marias e Mários mas traduz uma realidade crescente no Brasil e no mundo: a responsabilidade no cuidado com o idoso. Essa responsabilidade varia entre diferentes culturas, mas no Brasil é atribuído predominantemente à família, sendo a esposa (ou esposo) o cuidador em potencial e na sua ausência os filhos. Também por uma questão cultural em que o papel de cuidador é atribuído mais fortemente às mulheres, observaremos, na maior parte dos casos, filha mulher ocupando o papel de cuidador principal.
Em post publicado nesse blog, a pedagoga Lourdes Cruz fala sobre ganhos e desafios que precisamos enfrentar com o aumento na expectativa de vida. Ganhamos anos a mais e nossos pais também! Como consequência temos observado filhos cuidadores também idosos.
A realidade de muitas famílias é de idosos com melhores condição de saúde cuidando de outros idosos. Como há diferentes graus de cuidado, cuidar de pais idosos varia desde dar uma assistência em alguns aspectos diários da vida até o cuidado em tempo integral, a depender da condição de saúde física, mental e social do familiar.
Um outro fenômeno que temos observado em nosso meio é que as pessoas estão tendo filhos mais tarde e os filhos, por sua vez demoram mais a sair de casa, o que agrava a situação de pessoas que terão que cuidar simultaneamente de filhos e dos pais.
Amor e gratidão são as principais motivações referidas para o cuidado. Porém a rotina exige dedicação que muitas vezes implica em prejuízo da qualidade de vida do cuidador que passa a negligenciar parte ou todos os aspectos da sua própria vida.
A dificuldades em dividir a responsabilidade do cuidado na família, a cobrança social e moral desse cuidado em tempo integral vai limitando a vida do cuidador. Preso à rotina do cuidado com o familiar e com as tarefas domésticas, não consegue mais sair de casa como antes, diminuindo suas possibilidades de lazer e integração com outras pessoas. Queixa-se de solidão, perda de liberdade, cansaço, e frustração. Muitos cuidadores contam apenas com o choro como alívio e a oração como suporte emocional para o enfrentamento de uma rotina desgastante.
Para alguns, o acesso à internet e as mídias sociais o aproximam de contatos humanos, mesmo que virtuais. Através de uma tela de computador ou celular o cuidador encontra a principal (quando não única) forma de interação com outras pessoas.
É preciso encarar a dificuldade no cuidado, reconhecendo que mesmo feito por amor traz um desgaste e uma necessidade de criar suportes para quem cuida. É extremamente importante que o cuidador encontre formas de:
- Reconhecer suas necessidades pessoais – físicas, emocionais, espirituais, afetivas, financeiras e de lazer, buscando alternativas de satisfazê-las mesmo que parcialmente. Reconhecer que é preciso conciliar amor / cuidado com auto preservação / auto cuidado. É preciso estar bem para cuidar;
- Pedir ajuda e apoio psicológico à familiares, vizinhos ou amigos;
- Identificar recursos sociais e de saúde que possam contribuir com esse cuidado (através de informações, grupo de cuidadores, atividades físicas e de auto cuidado, entre outros);
- Evitar trazer para si o comportamento difícil e hostil do familiar, quando houver;
- É preciso despojar-se de valores e cobranças morais para poder agir mais livremente, avaliando as melhores alternativas para a família como um todo, incluindo a atenção e solidariedade para o cuidador principal.
Por Maria Aparecida Costa Assistente Social e Educadora em Saúde Pública aposentada pela PMSP. Especialização em Gerontologia.
Para saber mais: MSD
Foto de Capa: Pexels
1 comentário
Olá, Maria Aparecida, tudo bem?
Prazer, meu nome é Fernanda.
Em abril de 2017, comecei um projeto, o blog Feminidade (www.feminidade.com.br). Esse blog tem como objetivo falar sobre beleza e bem-estar para as mulheres da terceira idade.
Para dar início ao blog, precisei pesquisar bastante… e encontrei o seu site! Por isso, gostaria de parabenizá-la por todas as informações que você divulga para o público idoso.
Você inspirou o meu trabalho e, além disso, conquistou uma leitora. No caso, eu! Rs
Será um imenso prazer se a gente puder continuar trocando informações.
Um abraço,
Fernanda
Blog Feminidade – http://www.feminidade.com.br